Goffredianos de 68 – Arnaldo Malheiros Filho

Arnaldo Malheiros Filho
Advogado

Perdoem-me os bacharéis de 1968 do Largo de São Francisco (e quantos amigos tenho entre eles!) que se autodenominaram “Turma Professor Goffredo Telles Junior”, porque a Turma Goffredo de 68 é a nossa, a dos formandos de 1972, que fomos os calouros de 1968, guiados por entre a mescla desse ano mágico com a mística da Academia pela mão de nosso lente de Introdução à Ciência do Direito.

O termo “geração de 68” é ambíguo. Por que não serviria para designar os que deixaram a Universidade naquele ano? E quem duvida que ele caracteriza também os que nesse ano tiveram mutação significativa em seu pensar e agir, um salto qualitativo , como é o caso do próprio Goffredo (cf. A folha dobrada, p. 870)? Ou então podemos restringir-lhe o alcance, para englobar aqueles que tínhamos então entre 17 e 22 anos, que abríamos nossas primeiras janelas para o mundo; que nos permitíamos sonhar e amar sem juras de eternidade, porque tínhamos sede de viver nosso momento; que às vezes queríamos proibir as proibições e entregar o poder à imaginação, mas que vivíamos na política a contradição entre o anseio de liberdade infinita e a ditadura do proletariado, que vivíamos na arte a contradição entre o engajamento e o tropicalismo, que tanto aplaudíamos Goddard, como Truffaut, como Stanley Kubrick, que oscilávamos da caretice revolucionária à revolução da contracultura, que fazíamos na cabeça uma salada temperada por Gramsci, Althuser, Cohn Bendit, Marcuse, MacLuhan…

Esta última, que eu poderia chamar de “a minha geração de 68”, foi a que descobriu, simultaneamente, a Universidade e Goffredo.

Antes de chegarmos lá, ele já era lenda. Assumira interinamente a Diretoria, Vice-Diretor que era então, e presidira o nosso vestibular, diferente dos anteriores e posteriores, com Português, Latim (sem dicionário), Inglês, Francês e História da Filosofia. A fama era de notívago e amigo dos alunos, tão amigo que poderia sair com eles pela noite de São Paulo, filosofando pelos bares afora.

O que víamos, no entanto, não combinava: Malgrado interino, Goffredo pusera na rua funcionários graduados e históricos, figuras folclóricas de “amigos dos estudantes”, porque, soube-se depois, fundaram uma “Faculdade virtual”, que mercadejava vagas e diplomas; o homem não tolerava desonestidade, nem que viesse de “gente boa”…

Logo nos primeiros dias de aula, uma portaria do Diretor em exercício mudava radicalmente o sistema de promoções e dependências, tornando-o muito mais severo; o homem não dava moleza aos alunos…

Nós, calouros, sequer sabíamos o que eram “dependências”, mas o XI de Agosto convocou assembléia para decidir sua ação contra a malsinada portaria. O Diretor em exercício, ao tomar conhecimento disso, mandou avisar que compareceria, e estaria à disposição dos estudantes para justificar e explicar sua decisão, o que de fato fez; o homem era corajoso…

Nos corredores, no pátio, no XI, não havia unanimidade: uns diziam que Goffredo era o máximo, mas havia quem o criticasse. Certos setores da esquerda (e naquele tempo havia, na Faculdade, quase tantas esquerdas quantas são as linhas que, na Geometria, passam por um determinado ponto) o amaldiçoavam porque havia publicado um livro (era o chamado patrulhamento… ) em que ofereceria um programa para a dita Revolução de 64; a direita dizia-o comunista ou “pelo menos um inocente útil”, anátema com que então ferreteava qualquer espírito independente. Fui, com alguns colegas, convocado para um curso paralelo de Filosofia, dado na sala do Chico Elefante, baseado na obra de um certo Afanasiev, apresentado como “da Academia de Ciências da União Soviética”, apenas para “não ser contaminado pelas idéias burguesas do Goffredo”. Nesse clima chegamos às aulas da “lenda viva”.

E qual não foi a nossa surpresa ao ver aquele jurista falando… do amor! E de ver aquele intelectual, tão rica e laudatoriamente titulado pela Universidade, a exaltar a sabedoria dos simples! A ensinar o quanto valia a palavra de um velho sentado à soleira de uma porta, à maneira daquele personagem de Guimarães Rosa que “morava era em si, no cujo saber de caramujo, ensinando a viver, sua pólvora bem inventada”. Um professor que falava de Direito, sim, mas muito mais de liberdade e de justiça.

Logo no início do ano letivo, no dia 27 de março, a polícia carioca matou o estudante Edson Luís Lima Souto, que participava de protesto contra o aumento do preço das refeições no restaurante universitário conhecido como “Calabouço”. A greve estudantil foi decretada incontinenti. A primeira assembléia do XI de Agosto a que compareci, realizada na Sala dos Estudantes, colocou em votação uma proposta do representante da POLOP (“política operária”, em sigla de ares russos), no sentido de que o Centro Acadêmico viesse a “exigir a imediata renúncia do Presidente Costa e Silva”. Não me lembro se a proposta foi ou não aprovada, só me recordo de que ela não fez a mínima mossa ao General…

Naqueles dias o retrato do capitalismo era o massacre de civis no Vietnã. Na Tchecoslováquia, Alexander Dubcec tentava a “Primavera de Praga”, uma experiência de socialismo com liberdade, mas a dialética marxista logo chegou, transportada sobre lagartas que esmagavam quem se interpusesse em seu caminho. Ao mesmo tempo, nas universidades americanas, jovens alimentavam com seus draft cards as piras da paz, e tinha-se notícia de que, no Leste europeu, estudantes, intelectuais e líderes sindicais começavam a formar uma “resistência” anti-soviética.

Na França, que então se despedia do proscênio mundial, a Universidade explodiu em revolta criativa, com a ocupação de seus prédios pelos estudantes. E, se assim era lá, assim fizemos aqui. Nossa assembléia se realizou, deliberadamente, com pouca gente, na noite do domingo 23 de junho. Decidida a ocupação, convenceram disso o guarda-noturno Armando (a quem Goffredo sempre dedicou afeição, como de resto a todos os funcionários da Faculdade, e veio a ajudar como testemunha decisiva quando ele sofreu injusto processo administrativo), que só pediu que lhe apontassem uma arma, para justificar sua própria rendição, tendo sido atendido de bom grado.

Em seguida, o espírito de troça estudantil se fez presente: passava por ali um caminhão de tijolos, indagando por um certo endereço, onde seus tripulantes teriam que entregá-los. Um acadêmico logo disse “é aqui mesmo”, e, assim, as portas do Largo de São Francisco – as de Fagundes Varela, Castro Alves e Álvares de Azevedo – foram emparedadas.

O acesso à Faculdade era feito através da porta do XI de Agosto, na Rua Riachuelo; atravessava-se o restaurante, sua cozinha e, então, havia que pular uma janela sobre a pia. Essa janela dava para um corredor externo, destinado à iluminação de duas alas do prédio, que os ocupantes apelidaram de “Termópilas”, onde combatíamos à sombra das noites, armados de violão e flauta doce. O “desfiladeiro” ia ter aos fundos do banheiro do andar térreo, naqueles dias ainda conhecido pelo nome de “Sala Adhemar de Barros”.

Surpreendemo-nos com a adesão de alguns professores – como não poderia deixar de ser, Goffredo à frente –, que lá estiveram a nos manifestar apoio e a participar de seminários e debates sobre a nova Universidade com que sonhávamos. Entre os catedráticos, além de Goffredo, Ataliba Nogueira, Cesarino Júnior, Canuto Mendes de Almeida. Dos livre-docentes destacavam-se duas figuras caríssimas: José Ignacio Botelho de Mesquita (não por acaso eleito por votação consagradora o paraninfo de nossa Turma de 1972) e Fábio Konder Comparato, por quem jamais uma turma de alunos passou incólume; dois homens de coragem e retidão, de firmeza e coerência incomparáveis. Nós, os estudantes, não sabíamos disfarçar a estupefação de ver homens da circunspecção de Goffredo, alguns já entrados em anos, galgando a pia da cozinha do XI, pulando a janela e atravessando o banheiro para chegar à Faculdade!

Enquanto isso o grosso da Congregação se reunia no aconchego da residência do Diretor Alfredo Buzaid e outorgava procuração ao Professor Geraldo de Ulhôa Cintra para requerer em Juízo a defenestração dos estudantes. Naqueles dias de ditadura pré-AI-5 havia ainda um resquício de legalidade: segundo corria na época, Buzaid pleiteara do Governador Abreu Sodré o uso de força policial para “restabelecer a ordem”, pleito negado pelo veterano udenista, que ainda deu uma lição de Direito ao Diretor da Academia: que deduzisse em Juízo sua pretensão e obtivesse lá a força a que acaso fizesse jus.

O Judiciário reconheceu o direito da Faculdade, representada por seu Diretor, à posse das Arcadas, declarando, outrossim, a posse mansa, pacífica e imemorial do XI de Agosto sobre suas dependências. O mandado foi executado com força da Polícia Militar e apoio do Corpo de Bombeiros no mês de julho, levando-se ao DEOPS os 43 estudantes que haviam decidido ficar para aguardar o ato. No casarão do Largo General Osório eles foram identificados e depois submetidos a inquérito administrativo na própria Escola – o famoso “processo dos 43”, que nunca foi julgado pela Congregação. Reintegrado na posse do imóvel, Buzaid tirou um mês para limpá-la das pichações (naquele tempo havia um fantasma dos estudantes, um certo “acordo MEC-USAID” que, ao que me consta, nunca chegou a fazer mal a ninguém, mas só perdia em rejeição para o Diretor, tido como mal maior: nas paredes escrevia-se “Usaid mas não A. Buzaid”; outros dizeres iam de “Velho catedrático, sobrinho assistente” a “Chega de Igrejas!”). Só no fim de agosto voltamos às aulas.

Goffredo inaugurou o retorno avisando à classe que sua aula seguinte versaria sobre o tema “Evolução e Revolução”. No dia aprazado, a Sala Barão do Ramalho viu uma de suas maiores aglomerações: Nelson Rodrigues diria que “tinha gente até no lustre”, mas havia, de fato, gente nos peitoris das janelas, nos degraus do anfiteatro, no “fosso” onde ficava a mesa do Joaquim, no estrado que erguia a cátedra. Alunos dos cinco anos estavam lá. Com a didática que tão bem conhecíamos, passo a passo, o professor escreveu a partitura da música que almejávamos tocar; nos ensinou que a progressão quantitativa é mera evolução, sendo revolução a mudança qualitativa, quando se rompem as estruturas sociais e se dá início à construção de uma nova ordem que melhor convenha ao bem comum (por isso mesmo jamais supressora da liberdade), destacando que não poderia merecer o nome de revolução a quartelada que instalara o governo então reinante no Brasil, porque feita no afã de solidificar velhas e carcomidas estruturas, não de derrubá-las.

Chegamos ao final do segundo semestre depois de passar por várias passeatas e pelo Congresso da UNE em Ibiúna, com a prisão dos estudantes presentes, inclusive o Presidente do XI de Agosto que, junto com outros líderes, foi encarcerado no quartel da Praia Grande, sob o comando do Coronel Erasmo Dias, então na ativa.

Na última aula antes do exame final, Goffredo colocou-se à disposição da classe para esclarecer dúvidas. Um aluno indagou: “Professor, o Senhor nos ensina que a lei é um ‘imperativo atributivo’, porque sem possuir a força, atribui ao titular do direito o seu uso; ora, como pode a lei atribuir o que ela mesma não possui?”. Para um professor ignorante ou sem muita lisura intelecutal a pergunta não seria difícil de responder; não, porém, para o sábio. Goffredo ensaiou dizer alguma coisa, mas em seguida nos brindou com uma incrível demonstração de humildade e honestidade: disse que precisava pensar melhor no assunto, e convocou aula para a semana seguinte, quando traria a resposta.

Outra vez a Sala Barão do Ramalho extrapolou sua capacidade de lotação. Quem já vira um professor com aquela atitude? Todos queriam testemunhar a resposta, e veio outra surpresa: Goffredo reconheceu publicamente que o conceito impresso em sua Filosofia do Direito não era o ideal, e de público o retificava, para dizer que a lei era “autorizante”. Só as almas gigantes são capazes desse gesto!

Já que estou no tema aproveito para dar um testemunho. É que ao longo dos anos ouvi falar de várias pessoas que se apresentavam como “aquele aluno do Goffredo” sem que o fossem. “Aquele”, de verdade, chama-se Antônio Augusto César e hoje é Subprocurador-Geral da República. Isso eu vi, com estes olhos – como diria Drummond – “que a terra há de comer, mas não coma já”.

1968, consagrou-o Zuenir Ventura, foi o ano que não terminou. Ele foi abortado criminosamente no dia 13 de dezembro, pelo Ato Institucional nº 5. Uma enxurrada de água fria caiu sobre nós; os irmãos compositores Marcos e Paulo Sérgio Valle, rápidos no gatilho, trocaram sua viola enluarada por um Mustang cor de sangue ou um simples Corcel cor de mel. Quanto a nós, trocamos nosso ardor estudantil por um incrível medo. Medo por nós mesmos, pela Faculdade, pelos Professores que se irmanavam em nosso espírito, dos quais Goffredo era o epítome. Fomos visitá-lo no apartamento da Rua Martins Fontes, onde ele nos recebeu com Maria Eugênia. Trocamos informações, demos nossa solidariedade, procurando por conforto. Eram dias de angústia e angustiados nos despedimos. Goffredo atuou decisivamente junto ao Ministro da Justiça, Gama e Silva, professor de Direito Internacional na Faculdade, que acabou preservando-a do expurgo que maculou o restante da Universidade. O papel de inquisidor perverso restou monopólio de Alfredo Buzaid.

Concluídos os exames de segunda época (pois o “amigo dos estudantes” era também um amigo do estudo…), o catequista do batistério acadêmico despedia-se formalmente de minha turma.

A ruptura formal da relação professor-aluno, contudo, não esmaeceu aquela presença forte e constante. Vigente o AI-5, Alfredo Buzaid não se conformava com o fato de que a Faculdade de Direito fora poupada da devassa que a ditadura promoveu na Universidade de São Paulo, não tendo nenhum de seus professores cassado. Por isso entregou-se a campanha de intriga e delação, indo levar a militares ou a seus próximos notícias sobre “comunistas” à solta em pleno Largo de São Francisco. Os alunos acompanhavam com apreensão e tentavam interferir na medida do possível, prestigiando seus mestres. Goffredo viu-se na situação kafkiana de apresentar-se à Congregação para se defender, perante seus pares, de acusações apenas sussurradas, mas nunca pronunciadas frente a frente, sustentando seu elementar direito de pensar e ensinar o que pensava. Esse “pronunciamento” foi publicado como separata da Revista da Faculdade e passou de mão em mão entre os alunos durante longo tempo.

A presença de Goffredo, enfim, tornou-se uma constante no período que nos restou de Faculdade e além dele.

As trevas do AI-5 se adensaram e chegaram ao limite de saturação da sociedade com o assassinato de Vladimir Herzog nas dependências do DOI-CODI. Testemunha presencial da tortura a que ele fora submetido, o jornalista Rodolfo Konder via-se sem condições de sobrevivência no Brasil e resolveu deixar o país clandestinamente, não sem antes registrar o que tinha a dizer. José Carlos Dias, com quem eu trabalhava na época, quis colher um depoimento na presença de testemunhas que tivessem a credibilidade da retidão de caráter, a dignidade de guardar segredo enquanto necessário fosse e a coragem de falar quando chegasse a hora. Lá veio o nome de Goffredo (ao lado de Prudente de Moraes, neto, Hélio Bicudo e de um padre católico). Coube a mim ser o escrevente dessa assentada clandestina; pilotando uma IBM 72 eu ia registrando as palavras de Rodolfo, que um dia viriam a condenar a União Federal por tortura, na presença daquelas testemunhas qualificadas e de meus colegas de escritório.

Também foi Goffredo o nome lembrado de pronto quando, em 1977, José Carlos Dias, Flávio Bierrenbach e Almino Affonso tiveram a idéia de lançar ao público um texto que exprimisse os anseios da comunidade jurídica. Chegáramos, finalmente, a uma quase unanimidade nesse meio: era impossível sobreviver na ditadura. Faltava um roteiro que, de forma clara e firme, fizesse a amarração dessa unidade espontânea.

Foi quando Goffredo, em iluminado momento, escreveu a “Carta aos Brasileiros”. Valendo-me de meus anos de revisor na “Revista dos Tribunais”, desempenhei essa tarefa também na “Carta”, o que me encheu de orgulho, somente por me fazer sentir próximo desse evento. O texto era, como disse José Carlos Dias, uma autópsia do quadro constitucional brasileiro, ensinava-nos a diferença entre legal legítimo e culminava por proclamar que: “A consciência jurídica nacional quer uma coisa só: O Estado de Direito já!”. Com a “Carta” foram comemorados os 150 anos de ensino jurídico no Brasil.

Trabalhávamos unidos por nossa desunião. Explico: lutávamos pelo direito de sonhar, nem todos conscientes de que, ao conquistá-lo, sonharíamos sonhos diferentes para o Brasil, fracionando-nos em partidos e correntes, como é natural, salutar e corriqueiro nas democracias.

Cinco anos depois, já com a “abertura política” correndo à vela cheia, esta mesma Revista do Advogado , na época sob a coordenação de Maria Eugênia, comemorava brilhantemente o aniversário da “Carta”, em edição histórica.

Mais tarde vim a assistir a sua última aula – nem de longe a última lição ou a despedida da Faculdade! –, momento tocante na Sala João Mendes Júnior, sua preferida, que em 68 servia aos alunos do 2º ano. Alunos de todas as séries, ex-alunos e professores se congraçavam na celebração do coroamento de uma carreira.

Estas reminiscências que ora me ocorrem não têm nenhuma importância maior que de uma confissão de dívida. Só as coloco no papel para ilustrar – ainda que não da melhor maneira possível – o débito que os calouros de 1968 das Arcadas, os goffredianos de 68, têm para com o seu Mestre.

Recebendo-nos naquele ano conturbado – conturbado para o País, que tentava se encontrar consigo próprio; conturbado para nós, jovens que buscávamos nos posicionar num universo em crise; conturbado para ele, que dava um salto qualitativo em seu pensamento –, ele nos ensinou a nos relacionarmos com o Direito.

Não num vínculo de mera obediência ou de fidelidade canina, mas de amor . Amor que, como todo amor, não é incondicional, não é perpétuo, mas – como em 68 dizia Vinicius – que é infinito enquanto dura, e oxalá durassem todos para sempre. Isso porque, segundo aprendemos com Goffredo, não se ama o Direito porque ele é Direito, nem porque é imperativo, ou legal , dado pelo Estado ao povo como carga descida na ponta de um cabo. Ama-se o Direito se e quando ele é legítimo , se e quando corresponde às aspirações de um povo, para lhe garantir a liberdade e propiciar-lhe a justiça.

O pensamento goffrediano nunca se acomodou, como vimos com O direito quântico e inda agora com Iniciação na ciência do direito , onde se nota a evolução de algumas idéias de nosso tempo de calouros. Inquieto e inconformado, indignado às vezes, ele não pára.

Foi assim que esse juspoeta se fez um Eluard em prosa, escrevendo o nome liberdade em toda a parte e buscando justiça para toda a gente, clamando e pregando pelas gerações afora.

E se os deuses do Olimpo achavam que o pior dos castigos era o trabalho que nunca acaba, ficariam desarvorados se conhecessem esse Sísifo por vocação e vontade própria, um homem que nunca poderá ter o conforto de dizer “missão cumprida”, porque escolheu dar a si por tarefa o constante renovar.